Prestes a completar quatro meses à frente do governo de Mato Grosso do Sul, Eduardo Riedel já vai implementando sua marca na gestão estadual. Nesta semana, ele deve anunciar novidades que estão ligadas a programas sociais e de infraestrutura.
Mas Riedel tem temas mais complexos para resolver. Um deles é a concessão de rodovias e de ferrovias federais, que não podem ser um entrave para a logística de Mato Grosso do Sul.
Ele também tem dedicado esforços para implementar uma política pública que reduza o temor da violência nas escolas. Quanto ao meio ambiente, está trabalhando em um projeto que concilie o apelo para a preservação do Pantanal e o desenvolvimento dos municípios que estão em seu entorno.
Apesar dos desafios, está otimista e acredita que, ainda em seu mandato, mais uma gigante da celulose anunciará investimentos bilionários no Estado e que a unidade de fertilizantes da Petrobras (UFN3) será retomada.
Como está a relação do PSDB com o aliado PP? A gente percebe que o PSDB hoje é um partido consolidado no Estado, o que tem mais prefeituras, e que o PP tem um plano de avançar. Como mediar essa disputa por espaço dentro da aliança?
Acho que foi até por isso que o Marco Aurélio Santullo [presidente do PP] deixou o governo. Foi para liderar esse processo político no PP, justamente para ter o ponto focal: a pessoa que possa sentar com o presidente do PSDB, com a diretoria do diretório do PSDB, e discutir essas alianças no âmbito municipal, né?
Está sendo tratado na mesa de conversa. Onde a gente conseguir convergência de grupos, ótimo.
Sim, mas é possível que eventualmente possa haver disputa entre PP e PSDB em alguns municípios?
Pode ser que em alguma cidade tenha uma disputa, mas sempre com um padrão ético. A disputa é natural, a democracia é isso. Portanto, essa aliança está sendo tratada de uma maneira tranquila, natural e com diálogo.
O debate sobre o possível avanço das monoculturas no Pantanal tem ganhado escala, ao mesmo tempo em que o bioma tem aumentado sua projeção mundial, seja pelo apelo ambiental ou turístico. Como o governo está lidando com isso?
O Pantanal é um bioma único, tem uma biodiversidade muito grande e é muito representativo para todo o território de Mato Grosso do Sul: tem quase um terço do nosso território e tem de ser tratado sob essa perspectiva.
É um grande ativo que Mato Grosso do Sul tem e tem de ser explorado da maneira correta.
E qual seria essa maneira? Plantando soja no Pantanal? Não. Há quem fale de determinadas culturas no Pantanal, mas elas são inviáveis pela natureza do que é o bioma.
A gente tem de adotar os mecanismos de proteção, de garantia que essa riqueza, que essa biodiversidade desse bioma seja mantida, mas com respeito e garantindo a viabilidade das pessoas que moram lá. Mas, claro, a gente não pode esquecer que o “bicho homem” está lá dentro, que é o pantaneiro, e que há uma cultura por trás disso.
E é essa cultura, a habitação humana, que muitas vezes garantiu o Pantanal estar do jeito que está. Então temos todos de tomar um pouquinho de cuidado. Quando se fala em fazer estrada no Pantanal, há pessoas que dizem: “Sou contra estrada no Pantanal”. Mas e as pessoas que estão lá? Essas são obrigadas a ficarem isoladas?
A demorarem três dias para chegar a uma cidade mais próxima? Então, até nos lugares mais remotos do mundo é necessário ter o mínimo de infraestrutura, de maneira adequada, sem poluir, com energia renovável.
Tudo isso deu condição para as pessoas que estão lá terem o mínimo da maneira correta. Essa foi a visão que tivemos, por exemplo, com o Ilumina Pantanal, que é um projeto que se viabilizou da maneira correta, adequada, sem poluir, com energia renovável, e deu condição de as pessoas que estão lá terem o mínimo.
Essa é a visão em relação ao Pantanal e a diretriz que vamos assumir enquanto política pública.
E quanto à política de zoneamento agroecológico? Ela já existe? Como o Estado encara essa possibilidade de haver monocultura no Pantanal?
Temos diferentes pantanais, e essa é uma discussão pertinente. Há um peri-Pantanal. Temos também o Pantanal da Nhecolândia, o Pantanal do Abobral, do Nabileque, lá em cima, depois do Taquari.
E em uma grande parte do Pantanal não cabe nenhum tipo de atividade agrícola em escala. Nem que se queira, é economicamente inviável, é impossível.
Aí temos uma região do peri-Pantanal, que está próxima ao Pantanal, mas em que existem algumas iniciativas, porque o risco é alto, a tecnologia não é dominada. Pelo fato de isso ter acontecido agora, gera toda uma discussão em torno da agricultura, e essa discussão é legítima.
O governo tem de estar atento a isso, e nós já estamos trabalhando e estudando em cima dessa discussão para garantir que o Pantanal tenha sua preservação. Para que isso não ocorra, não se expanda nessa região.
Mas já há plantio de soja em rios da Bacia do Rio Paraguai. O que é necessário então é uma delimitação?
Sim, temos duas grandes bacias, a do Rio Paraná e a do Rio Paraguai. Para o sudoeste do Estado temos Jardim, Caracol, Bela Vista, Guia Lopes, Anastácio. A agricultura cresceu nessas cidades. Agora, de fato, o manejo nelas é diferente.
Sim, e no caso de Bonito, por exemplo, tem a preocupação com o turismo, tivemos o problema do turvamento das águas…
Os setores têm de dialogar. Temos de ter muita rigidez com plantações em Bonito, com tecnologias de manutenção do solo. Tem de ser plantio direto, tem de fazer curva de nível. Não se pode abrir mão disso. E a fiscalização tem de estar atenta a isso.
Agora fazendo uma ponte para o Parque das Nações Indígenas e o Bioparque. O que vocês têm em mente? Fazer um parque que agregue atrações pagas e gratuitas, culturais, científicas e esportivas?
A ideia é criar um espaço multicultural. Um espaço que faça menção e uma homenagem ao nosso bioma Pantanal. O Bioparque já é algo muito forte nisso, né? Mas que a gente traga todas as influências culturais para dentro desse parque, desse complexo, é um atrativo, né?
Das mais diversas naturezas ali. Pretendemos entregar para quem sabe fazer, para quem conhece do assunto, sem tirar do cidadão um espaço que é de uso gratuito. Se a pessoa quiser correr, vai lá, não vai ter problema nenhum.
“Ah, mas e se ela quiser andar de roda-gigante?”. Tudo bem, ela adquire um tíquete. Também terá um restaurante, um bar, água de coco. Então, a ideia é pensar o Parque das Nações como um espaço absolutamente central para o bem-estar da população como um todo.
E o edital, sai ainda neste ano?
De repente é possível. Essa é uma parceria nossa com o BNDES. O BNDES esteve aqui com toda a sua diretoria, passamos dois dias trabalhando com a equipe, tive uma reunião com eles.
E eles já estão definindo quem vai fazer o estudo. Será uma licitação internacional, por isso agora eles vão fazer o estudo de viabilidade para nós colocarmos em leilão lá na frente. Acho difícil executar neste ano, mas a contratação do estudo, a execução do estudo, sai, sim.
Então, quando se faz o estudo, é como mostrar um diamante bruto a ser lapidado, que pode gerar um x de rendimento para quem se interessar.
Aí se escreve um edital baseado no estudo e vamos para a concessão, para o leilão com o edital. Mostramos ao mercado, fazemos uma audiência pública. Há todo um procedimento a ser seguido.
No Bioparque, vamos continuar com uma linha forte de pesquisa e de educação. Não vamos abrir mão das escolas públicas estarem presentes, visitando. Mas ele integra todo o estudo para o parque.
Neste mês de abril, vimos uma escalada da violência escolar pelo Brasil. Como você enxerga esse problema? Tem de envolver toda a sociedade também?
O que eu acho é que o poder público tem de passar uma mensagem e liderar um processo de essa mensagem chegar à sociedade, para que ela dê a atenção que esse problema requer. O poder público não vai resolver essa situação, o que vai resolver é uma conscientização coletiva.
Aí, a partir dessa mensagem, que tem de ser poderosa para as famílias, para os pais e mães, e quando a gente fala em família também não é somente naquele conceito antigo. Família é o ambiente que for dessa criança ou adolescente.
É para que haja uma atenção dentro desse ambiente. Estamos tratando de um fenômeno mundial, não é uma questão só no Brasil agora.
Há vários elementos que levaram a isso, é uma questão sociológica muito forte e tem de ser trabalhada com as famílias, com os adolescentes, com os meios de comunicação, com as plataformas. Para situações complexas, não existem soluções simples, não é?
Na verdade, pôr arma na escola não está resolvendo absolutamente nada. Até falaram em pôr Exército na rua: um monte de soldado parado na esquina fazendo o quê? Revistando crianças?
O policiamento só se faz necessário em momentos extremos, o policiamento preventivo, e nós temos aqui um projeto fantástico, o Escola Forte, Família Segura.
É o policiamento que se aproxima da escola, se aproxima da comunidade, dos pais, dos diretores, dos professores, dos alunos. Não é um ambiente de medo, é um ambiente de confiança.
O processo preventivo de confiança e de construção do ambiente escolar passa por esse projeto. Com o monitoramento eletrônico, nós temos uma resposta rapidíssima a situações extremas.
Como estão as negociações com o governo federal sobre as concessões de rodovias? Em janeiro, quando tomou posse, você havia dito que pretendia pedir a delegação de rodovias e de ferrovias federais caso a União não avançasse.
O governo federal está começando a atuar em cima de alguns eixos importantes na manutenção. Os processos de PPPs [parcerias público-privadas] estão avançando na modelagem deles. E repito: aquilo que eles tiverem dificuldade ou não quiserem por uma questão de pensamento, o Estado tem interesse em assumir.
Nós temos o caminho da modelagem adequada, do leilão feito, o que não podemos é inibir esses investimentos em função de uma possível demora. Agora, é um ativo deles, do governo federal. Mas nós vamos insistir nessa tese.
E quanto às estradas estaduais, o que tiver viabilidade nós vamos concessionar. O que não tiver viabilidade, vamos avançando com o investimento e com a capacidade que o Estado tem.
No caso da BR-262, sobretudo no trecho que liga Campo Grande a Três Lagoas, ela não está nos planos do governo federal, pelo menos por enquanto. Essa é uma das rodovias que o governo está disposto a pegar? Há viabilidade?
A BR-262 ainda não está no horizonte do governo federal, pelo menos eles não têm aventado isso. Acho que sim, tenho muita convicção disso.
Ali não é preciso fazer uma duplicação integral, mas um projeto bem modelado, onde há terceira faixa, serviço. É superviável, e a gente deve avançar nisso.
E quanto à Malha Oeste? Existe uma grande janela de oportunidade de demanda. Se o projeto de relicitação da União demorar, e também com o Marco Estadual das Ferrovias, também é possível pedir a delegação dela?
É possível. Essa é uma discussão que a gente vai abrir. Primeiro com a ANTT [Agência Nacional de Transportes Terrestres] e depois com o Dnit [Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes]. E temos uma audiência pública que vai iniciar o processo de relicitação da Malha Oeste.
É um projeto de longuíssimo prazo de viabilidade, por isso nós temos de procurar entender um pouquinho o projeto para avaliar se o governo federal consegue levar adiante um projeto exitoso, de concessionar, ou se terá dificuldade. Se tiver dificuldade, nós temos de inovar.
De repente dividir o trecho, o Estado assume uma parte, e aí criar outros mecanismos para viabilizar, o que é o nosso objetivo. Nosso objetivo é viabilizar.
Da parte estadual, o que ainda dá para fazer e está previsto para ser entregue na Infraestrutura?
A gente está com rodovias em pavimentação: MS-164, MS-166, MS-316, MS-289, MS-245, MS-338. São grandes eixos rodoviários e que mudam a cara de regiões importantes.
Como aqui entre Anastácio e Bonito [a rodovia do 21], que está em pleno andamento. Tem outras rodovias que vamos começar também. Esse é o nosso trabalho, e para isso não precisa de viabilidade econômica para concessionar. É o Estado investindo e fazendo.
Futuramente, podemos ter o anúncio de mais uma indústria de celulose ainda em seu governo?
Em relação a mais uma indústria de celulose, é possível. Não tem nada concreto, mas temos grandes players, grandes empresas olhando esse setor aqui.
E por que temos grandes empresas vindo para cá? O custo de produção é muito abaixo do que em outros lugares, no Brasil já é muito mais competitivo que no Chile e na Europa, pelas condições que estão formadas.
E Mato Grosso do Sul, dentro do Brasil, é o lugar mais competitivo de produção de celulose. Para se ter uma ideia, são US$ 289 a média brasileira, e aqui é a metade disso, e a margem é muito maior. Então, é possível que outros players venham para cá.
E tem a discussão da Eldorado com a Paper Excellence, e na hora que definir, pode ser uma segunda planta, uma duplicação. Então, no meu mandato, é possível que vejamos o anúncio de mais uma fábrica.
Agora em maio, teremos boas notícias da UFN3, de Três Lagoas?
Quanto à UFN3, é foco total. Transforma muita coisa e ajuda a produção. Estou otimista e no mês de maio vamos trabalhar firme nisso.
Perfil: Eduardo Riedel é governador de Mato Grosso do Sul desde janeiro deste ano. Já foi secretário de Infraestrutura e de Governo e também é empresário. É formado em Ciências Biológicas pela UFRJ e mestre em Zootecnia pela Unesp.
Álvaro Rezende/Divulgação
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