O Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS) entrou com uma ação civil pedindo a antecipação de tutela para a criação do Comitê da Bacia Hidrográfica do Pardo, com o intuito de preservá-la. De acordo com o documento, o comitê está previsto em lei, tanto federal quanto estadual, e o Estado está mais de 20 anos atrasado para implementá-lo.
Os sistemas nacional e estadual de gerenciamento de recursos hídricos são orientados pela Lei Federal n° 9.433/97 e pela Lei Estadual n°2.406/02, ou seja, há um atraso de 26 anos em relação à lei federal e de 21 anos em relação à lei estadual.
Ainda de acordo com o pedido do MPMS, em novembro de 2020, foi realizada uma reunião com o Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul) a fim de estimular a criação do comitê.
Na ocasião, o Imasul relatou que era necessário o interesse da comunidade para que “houvesse espontaneidade e legitimidade na criação do citado colegiado”.
O documento relata ainda que, nesse meio tempo, a professora Maria Helena da Silva Andrade, da Faculdade de Engenharias, Arquitetura e Urbanismo e Geografia (Faeng) da Universidade Federal de Mato do Sul (UFMS), apontou a existência de um grupo formado por pessoas de diversas instituições e representantes dos três segmentos necessários que lutava para a criação do comitê.
Ao todo, 29 integrantes faziam parte da iniciativa, que tinha representantes de usuários do rio, órgãos governamentais e da sociedade civil, desde julho de 2021. A professora solicitou apoio do MPMS para a legitimação do grupo.
Após o interesse público pelo comitê, houve uma nova reunião, realizada em setembro de 2021, apresentando não apenas os esclarecimentos para a implementação do comitê, mas também resultados de estudo científico que apontava que 80% da área da bacia estava antropizada, ou seja, tinha sofrido modificações humanas.
Mesmo assim, de acordo com o relatório do MPMS, a resposta foi dada quase dois anos depois, afirmando que seria necessário “ampliar a mobilização social, para garantir expressiva representação dos diferentes interesses quanto ao uso dos recursos hídricos na bacia hidrográfica, elaboração em conjunto do diagnóstico da bacia, com identificação de problemas, conflitos e demais situações que possam justificar a criação do comitê”.
A reportagem entrou em contato com o Imasul para saber os motivos da não criação do comitê e qual o posicionamento do instituto diante do pedido de liminar do MPMS, mas, até o fechamento desta edição, não houve resposta.
COMITÊ
A Bacia Hidrográfica do Pardo abrange 11 municípios em Mato Grosso do Sul, são eles: Bandeirantes, Bataguassu, Brasilândia, Camapuã, Campo Grande, Jaraguari, Nova Alvorada do Sul, Nova Andradina, Ribas do Rio Pardo, Santa Rita do Pardo e Sidrolândia.
O Plano Estadual de Recursos Hídricos dividiu os rios do Estado em Unidades de Planejamento e Gestão (UPGs), conforme as sub-bacias. A UPG do Pardo está na Região da Bacia Hidrográfica do Rio Paraná, que compreende uma área de 39.419,362 quilômetros quadrados.
De acordo com documento assinado pelo MPMS ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS), é necessário a criação do comitê da bacia hidrográfica, pois é um órgão deliberativo e normativo que assegura a participação paritária de representantes da sociedade civil e de usuários do rio.
Em Mato Grosso do Sul, há apenas um comitê estadual de bacia hidrográfica, que corresponde ao Rio Miranda, aprovado em 2005. Já o Rio Paranaíba está dentro do Comitê Federal da Bacia Hidrográfica do Rio Paranaíba, restando apenas a implantação dos comitês das bacias hidrográficas do Rio Ivinhema e do Rio Pardo.
O MPMS traz ainda dados que demonstram a necessidade de gerenciamento adequado dos recursos hídricos no Estado baseado em dois artigos científicos, publicados na Revista Brasileira de Climatologia, em 2011, e na Revista GeoPantanal, em 2014.
O primeiro levantamento relata que a Bacia Hidrográfica do Pardo apresenta o maior volume de água consumido no Estado, “em razão do consumo domiciliar e industrial de Campo Grande, com retirada, em 2009, de 2,585 metros cúbicos por segundo, o que é mais do que a bacia hidrográfica repõe”.
Ainda de acordo com o artigo, se houver continuidade dessa situação, haverá um aumento do número de eventos climáticos extremos e uma maior probabilidade de frequência de adversidades climáticas regionais.
O segundo estudo informa que o grande volume de atividade pecuária e agrícola, além das intervenções humanas na região da Bacia Hidrográfica do Rio Pardo, pode trazer consequências aos serviços de abastecimento de água. Essa ocupação “gera pressão sobre os recursos hídricos e ecossistêmicos, como qualidade da água, controle de erosão ou mesmo serviços recreacionais associados à água”, o que pode resultar em perda de qualidade desse recurso hídrico.
Entre os impactos que já podem ser observados no Rio Pardo está o assoreamento na foz do rio, que fica em um lago, em Porto Primavera. A constatação foi feita pela Companhia Energética de São Paulo (Cesp), que é a responsável pelo local e não aprofundou os estudos a respeito do assoreamento por acreditar que não é grave, comparado ao tamanho do lago.
SAIBA
A iniciativa para criar o Comitê da Bacia Hidrográfica do Pardo vai ao encontro da agenda verde que está pautando discussões e revisões de leis estaduais, principalmente as relacionadas aos recursos do Pantanal. Na semana passada, o Fórum Pontes Pantaneiras foi realizado em Campo Grande, o maior evento de conservação e uso sustentável do Pantanal feito em Mato Grosso do Sul.